TeE Entrevista: Wallie Ruy

Visitamos os bastidores do espetáculo “Priscilla – A Rainha do Deserto” e conversamos com a atriz Wallie Ruy sobre sua primeira experiência como protagonista de musical. Vem com a gente!

TeE: A primeira vez que conversamos, você tinha acabado de ganhar o Kikito em 2019 (prêmio do Festival de Cinema de Gramado), depois nos encontramos em Wonder, no teatro oficina, e agora estamos aqui com Priscilla. Após passar por diversas linguagens, qual é o seu teatro hoje?

WALLIE: Meu teatro do agora é um teatro-corpo, antropofágico, porque é um teatro que eu estou me alimentando e me construindo de muitas escolas. Quando eu ganhei o Kikito em 2019, já fazia 4 anos que estava no teatro oficina, e ali foi onde, de fato, transformei meus tabus em totens e me percebi uma artista transvestigênere em mutação. Em Wonder, me religuei com as minhas transcestralidades, com a Claudia Wonder e me auto coroei uma artista criadora, escrevendo as minhas próprias histórias.

E agora, sou uma artista que tem segurança, que pegou o medo no colo e anda de mãos dadas com ele e com as minhas certezas. É lindo, porque vejo muita gente andando do meu lado, então meu teatro agora é um teatro corrente, um teatro fogueira que está em chamas.

TeE: Nesse formato de Teatro Musical, você se descobriu uma nova artista? O que esse espetáculo, que é a primeira vez que você faz, te exigiu de diferente?

Wallie: É um teatro que exige muitas habilidades. Ligar essas habilidades todas era meu maior desafio, porque eu sou uma artista dionisíaca, que trabalha com a liberdade, a possibilidade de sair do eixo… e o Teatro Musical é um teatro apolíneo, que tem métricas, tempo, então às vezes, há um texto que precisa ser dito em 7 segundos, e não no tempo que eu quiser.

Me descobri ao encontrar nesse teatro múltiplo, onde não deixa de ser antropofágico, uma forma de manter as minhas entidades enquanto me comunico com esse teatro apolíneo. Hoje sei que sou uma artista dionisíaca no palco de Apolo.

TeE: Você também é docente há 7 anos já. Qual importância a docência tem na sua vida hoje?

Uma professora me disse que eu só fui começar a dar aula quando tudo começou a dar certo na minha vida, e isso ali foi a verdade sendo escancarada. Foi a maturidade da cena, do encontro de mim com o eu-artista que me possibilitou preparar outros artistas que desejam permear essa trajetória. É uma área que exige sacrifícios, mas que é extremamente gasosa, gozosa e fluida como água.

É muito prazerosa também. Então hoje, a Wallie professora, monitora da arte educação, preparadora de elenco e travesti numa instituição educacional, possibilita e inspira tantas outras pessoas que nunca se viram possíveis dentro daquele espaço. Estou andando com medo junto, e entendendo que o medo não é um lugar que deve nos barrar, mas um lugar que nos inspira a superar desafios.

TeE: Em sua fala aparece bastante a palavra inspiração, e muitas pessoas se inspiram muito em você, e com razão. Você é um artista incrível, com uma coragem excepcional em cena. É lindo te ver atuando, trabalhando… E o que te inspira hoje? Que tipo de artista ou movimento você vai atrás para se alimentar, já que você dá tanto de comer aos outros?

Wallie: A partir dos encontros, eu me alimento dos artistas que me permeiam. Eu me inspiro com aquelas que vieram antes e me reencontrar com as minhas transcestralidades foi muito importante e essencial para a artista que eu me torno hoje. O Zé Celso também foi e segue sendo um grande inspirador das minhas escolas. Encontro inspiração nas minhas travestis que permeiam as ruas ainda com o pajubá, essa linguagem subversiva…

Os arte educadores da cena, que também fazem das suas trajetórias um espaço de inspiração. Valorizo muto a arte educação, que é um lugar que possibilita a edificação de um pensamento artístico profissional. Projetos como o teatro em escala, que me impulsiona a entender de que a arte não funciona só no meu meio, mas também fora dele, e o quanto que as essas perspectivas transformam pensamentos.

A equipe que a cada novo trabalho eu encontro… Então, no final das contas, a antropofagia é o que nos une e o que mais me inspira.

TeE: Você falou dos encontros, o que ainda falta encontrar no mercado de trabalho para artistas transvestigêneres?

Wallie: Aqui em Priscilla, eu e Verônica falamos muito sobre a falta de proporcionalidade de corpas e vivências, especialmente nos espaços onde o dinheiro e a visibilidade permeiam. Quem pode abrir portas ainda é um grupo muito seleto, que majoritariamente é cis, branco, hétero, de classe média alta…

São as grandes instituições financeiras que podem abrir ainda as nossas portas, então precisamos delas como aliadas, para possibilitarem que a gente possa nos apresentar, produzir as nossas narrativas e construir novas histórias. O que falta hoje, não só na arte, mas na nossa sociedade de modo geral, é proporcionalidade e equiparação de direitos.

TeE: O que que você ainda tem vontade de fazer, que não teve oportunidade ainda?

Wallie: No final do ano passado, na virada do ano novo, me foi feita a pergunta “O que que você espera para 2024?”, e me recordo que falei “eu não saí em temporada, acho que eu nunca fiz uma temporada em turnê…”

Talvez esse seja o meu maior desejo hoje: sair em temporadas, em turnê pelo pelo país afora, fugir com circo.

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