Dramaturgo, diretor e ator de teatro, cinema e televisão, nascido em Milão, em Agosto de 1934 quando seus pais estavam se apresentando pela cidade.
Filho de artistas, seu pai era maestro e sua mãe harpista de renome.
Quando tinha apenas 2 anos de idade, sua mãe foi convidada a vir tocar na Orquestra Sinfônica Brasileira, no RJ. Nessa época, o governo Mussolini na Itália estava fechando o cerco contra seus opositores. Sua mãe viajou sozinha, deixando Gianfrancesco Guarnieri e seu pai na Itália. Seis meses após a partida de sua mãe, seu pai também recebeu um convite para reger aqui no Brasil e mais que depressa eles vieram embora.
Segundo o próprio Guarnieri, a ópera teve grande influência em sua carreira de artista, já que desde os 3 anos acompanhava seus pais nos concertos e se dizia maravilhado com aquilo.
Conheceu o teatro pelas comédias de Renato Viana na Cinelândia com menos de 10 anos de idade. A princípio levado pela mãe, e depois, fugia da escola para assistir aos espetáculos
Na adolescência, pediu ao pai pra mudar de escola, já que seus amigos estudavam em colégios de padres e ele também queria. Seu pai não concordou com a decisão, mas acatou, mesmo achando que ele não duraria muito tempo nesse meio. Foi no colégio de padres que Guarnieri começou a fazer teatro, no início ajudava na produção como ponto (a pessoa que fica “escondida” em uma “caixa” no chão na parte da frente do palco, e sopra aos atores o início de suas falas). Depois, por ser dedicado, passou a fazer parte do elenco.
Nessa época, o teatro da escola já era o que ele mais gostava.
Inquieto e criativo, aos 14 anos escreveu sua primeira peça: “Sombras do passado”, era a história de um sujeito que queria impedir a venda de uma casa que umas pessoas tinham ocupado, assim ele começou a assombra-la. Na peça, ele criou um personagem Gago, tudo para “homenagear” um padre chato que tinha no colégio que estudava. O resultado foi que Guarnieri foi expulso da escola, como seu pai previra.
A vida acadêmica não era tão bem sucedida e aos 15 anos foi tentar o supletivo. Já no colégio tradicional, foi se envolver com o Movimento estudantil, que tomava todo seu tempo.
Nessa época seus pais se mudaram pra SP, mas ele ficou no RJ. Tendo que trabalhar pra se sustentar, virou auxiliar de escritório em uma construtora. Ali, um dos serviços era fazer o pagamento dos operários, assim ele viu a insignificância com que eram tratados e quão pouco eles ganhavam. Então, como um integrante da juventude comunista, não aguentou aquela realidade e partiu pra SP.
Em São Paulo, com pouco mais de 18 anos e já membro do partido Comunista, uma de suas funções era organizar uma agenda cultural para os estudantes, assim Guarnieri passou a percorrer os teatros em busca de cortesias, e consequentemente, a ter mais contato com as pessoas da classe teatral, e isso fez despertar seu gosto pelo palco, que estava guardado.

O principal assunto da dramaturgia de Guarnieri é o ser humano: as condições em que as pessoas vivem, injustiça, desigualdade social, lutas de classes… sua arte é para defender o povo.
Eu Gabi, particularmente gosto de quando Guarnieri fala sobre como fazia sua arte: “Eu sempre me diverti muito escrevendo e atuando…. O naturalismo, para mim, é uma vontade de ser a cópia, de tentar imitar a situação. A naturalidade é o oposto, é o não ser a cópia.”
E ele ainda destaca a importância dos ensaios, diz que eles servem para fazer as palavras fluirem na ação, isso é um baita aprendizado pra nós, atores e eternos estudantes.
Desde moço, Guarnieri queria mesmo era fazer teatro nacional, o teatro nacional brasileiro. Além disso, queria mudar o jeito como a sociedade era, as opreções, os direitos. Mas como?
Os estudantes deveriam receber algo mais concreto, uma forma de se manifestar, não apenas matarem aulas e sairem gritando palavras de ordem. Foi assim, nesse contexto de desejo de mudança, por conta da política da época, que surgiu o TPE (Teatro Paulista do Estudante), e a ligação definitiva de Guarnieri e o Teatro, ainda como ator.
No mesmo ano que surge o TPE, aparece também o Arena. Pouco depois da abertura do último, Guarnieri e vianinha recebem o convite de Zé renato pra integrarem o elenco. Como fica mexido com a ideia, mas não quer largar o TPE, a solução encontrada foi: ele e Vianinha iriam para o Arena, mas o grupo daria suporte as montagens do TPE.
Sua estreia como ator profissional se deu no Arena em 1955.
Em 1958 estreou no arena Eles não usam Black-tie, muito bem recebido pelo público.
O sucesso de bilheteria rendeu diversos prêmios no Brasil e no exterior, salvando as finanças do Teatro de Arena que estava prestes a falir, e inaugurando a fase nacionalista da companhia. Com toda essa nova forma e linguagem de criar e discutir os problemas sociais que Black tie trouxe, o Arena acaba dando início ao seminário de dramaturgia, para revelar novos autores que pudessem fazer um retrato do Brasil no palco.
Depois, no Teatro de Arena ou em outras companhias teatrais, vieram outras das 20 peças que escreveria – invariavelmente com cunho social ou político.
No Arena, ficou de 55 a 65. Logo depois do anúncio do golpe de 64, o Arena parou por conta própria, os militares fariam isso cedo ou tarde, e no dia seguinte ao voltar pra Casa Guarnieri se deparou com soldados rondando sua região e mais que depressa entendeu que deveria sumir dali pro seu próprio bem. Em meio a isso, ao lado de Juca de Oliveira, partiu em exílio para Bolivia, o que duraria 3 meses, distante dos pais, da esposa e dos filhos, sem notícias de nada nem ninguém, apenas as poucas informações ouvidas no rádio.

Devido ao cunho político de seus textos, Gianfrancesco Guarnieri enfrentou problemas com a censura do regime militar. A peça Animália chegou a ser proibida em 1968. A partir daquele ano, Guarnieri sentiu-se obrigado a adotar a linguagem metafórica para falar da realidade do país – Um Grito Parado no Ar, por exemplo, é centrado nas frustradas tentativas de um grupo teatral de executar sua peça, oferecendo um retrato da situação de isolamento a que fora confinada a sociedade brasileira.
Seu trabalho com o teatro revelou uma nova faceta: a de compositor. A canção Upa Neguinho, por exemplo, feita para o espetáculo Arena Conta Zumbi, é uma parceria de Gianfrancesco Guarnieri com Edu Lobo. Upa Neguinho tornou-se um clássico na voz da cantora Elis Regina.
Na década de 80, sua carreira como autor de teatro se tornaria cada vez mais esparsa, lançando poucos textos. Subiu num palco pela última vez no dia 15 de agosto de 2005, no Teatro Maria della Costa.
Guarnieri casou-se pela primeira vez em 1958, com a jornalista Cecília Thompson, com quem teve dois filhos, Paulo e Flávio Guarnieri, ambos também atores. Com sua companheira dos últimos 40 anos, a socióloga Vanya Sant´Anna, teve mais três filhos, Cláudio (Cacau) e Mariana, que também seguiram carreira teatral, e seu mais novo, Fernando Guarnieri.
Gianfrancesco Guarnieri gravava no Teatro Oficina a telenovela Belíssima, da Rede Globo, em que interpretava o personagem Pepe, no dia 2 de junho de 2006, quando sentiu-se mal, sendo internado no Hospital Sírio-Libanês, onde veio a falecer de insuficiência renal crônica, cinquenta dias depois, no dia 22 de julho.
Não posso deixar de destacar seu personagem que marcou a minha vida e de muitos da minha geração: Orlando – o avô de Lucas Silva e Silva, do seriado “Mundo da Lua”.
A esse gênio da dramaturgia deixo apenas meu Muito Obrigada pela sua luta, pela sua história e por tudo que nos deixou e ensina diariamente.
Texto por: Gabrielle Risso
Bibliografia
Sérgio Roveri – Um grito solvo no ar
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