Baseada no texto “Not About Nightingales” do dramaturgo norte-americano Tennessee Williams, a cia. Triptal em seu projeto Homens à Deriva faz seu interlúdio no Teatro João Caetano em São Paulo, com direção de André Garolli e grande elenco.

A peça faz jus ao nome, começando pelo interlúdio expressionista. A iluminação de todo o espetáculo é formada a partir dos moldes da vanguarda do século XX, guiando a visão e atenção do público em focos ora no gabinete do diretor, ora em partes do presídio, onde todas as transições são feitas de forma extremamente precisa, clínica. A direção fez um minucioso trabalho de prestar atenção em cada detalhe da iluminação, onde nada que não fosse intencional vazava ao olhar em cena.
Outro ponto positivo é a cenografia. O gabinete do diretor-chefe é simples, objetivo, sem a sensação de sobrar nada. Mas a construção das celas, que é feita a partir do empilhamento de esqueletos de cadeiras, onde os atores transicionam e as transmutam conforme o desenrolar da narrativa é impactante ao olhar, em especial quando o coro de atores olham todos diretamente para a platéia. Fica nítida a crítica ao sistema carcerário que “jogam” os presidiários em espaços pequenos, apertados, desumanos.
Mas o ponto chave de todo o espetáculo é sem sombra de dúvidas o trabalho dos atores. Fabrício Pietro que vive o personagem Warden Whalen, o diretor-chefe do presídio, traz um personagem que poderia facilmente cair no estereótipo do vilão, mas Pietro constrói uma humanidade intrínseca, com nuances certeiras em todas as suas falas, que faz o público se perguntar o tempo todo “o que eu faria se estivesse no lugar dele?”, até mesmo nas ações mais cruéis da personagem. Junto com Camila dos Anjos, Fernando Vieira, Athos Magno, Simone Rebequi e Lucas Guerini, o jogo de poder que se estabelece entre os atores é tão envolvente que os 110 minutos passam quase despercebidos.
O coro, composto por outros 30 atores, traz uma plasticidade encantadora ao mesmo tempo que triste. A dualidade entre beleza estética e a conotação dos corpos enfileirados instiga a reflexão de quem assiste, instigando o questionamento: como somos afetados por essa realidade? E até que ponto afetamos a vida dessas pessoas?

O único ponto “negativo” do coro, mas totalmente compreensível por se tratar de mais de 30 pessoas diferentes, e provavelmente um obstáculo enfrentado desde os gregos antigos, é a sincronia. As cabeças que viram em momentos chave dos diálogos, por exemplo, algumas sofreram com uma espécie de “delay”, e que por estarem tão expostas no palco, ficou nítido e acabaram roubando a atenção em alguns momentos. Com mais ensaios e apresentações, é um “problema” que deve ser resolvido.
Com uma proposta épica de encenação, o espetáculo é essencial para todos os amantes, estudantes e apreciadores das artes cênicas, por apresentar um show de atuações, direção concisa, iluminação e cenografia de ponta.
Serviço (Nova temporada)
Espaço Cia da Revista: R. Alameda Nothmann, 1135 – Santa Cecília.
Temporada: de 10 a 31 de outubro. Terças, Quartas e Quintas, às 20h. Grátis.
Duração: 110 Minutos.
Classificação: 16 Anos.
E você, já assistiu? Pretende ver ainda? Conta pra gente o que achou!
AUTOR: JOHN MARQUES
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