Um olhar sobre: Adolfo Celi

Nascido em 1922 na Itália, Adolfo Celi formou-se pela Academia de Arte de Roma, dirigida por Silvio D’Amico. Começa sua carreira profissional como assistente de direção de Luchino Visconti e também outros profissionais, se torna diretor e ator de teatro e de cinema. Celi, então com 27 anos, chega ao Brasil vindo de uma temporada em Buenos Aires – onde atua em um filme com Aldo Fabrizzi – a convite de Franco Zampari em Janeiro de 1949 para dirigir o mais novo teatro da cidade de São Paulo: Teatro Brasileiro de Comédia (TBC).

Nos seus meses em Buenos Aires, Celi fora convidado pelo grupo teatral (profissional) La Mascara para montar Antígona de Sófocles. A montagem foi bem vista pelo público e rendeu alguns convites a o diretor. Nesse processo de criação, Celi usou de experimentação: depois de uma leitura em voz alta do texto, interpretando ele mesmo todos os personagens; traça um roteiro: 1. um mapa filológico do texto; 2.as mudanças psicológicas; 3. impulsos para ação; além de marcações e referências técnicas rabiscadas nos roteiros para ajudar os atores.
Com apenas uma semana de experimentações, Celi se convence da qualidade desse método e parte para o próximo passo: desenhar em planta baixa cada cena, as entrada e saídas, ações e pausas, luz e sombras, tudo o que era necessário para atender aos mínimos detalhes de uma montagem aclamada.

Adolfo Celi – 1975

Sobre Antígona do grupo La Mascara diz o diretor: “Ensaiei o coro por três meses e meio […] Saiu uma pantomima esquisita, semiclássica e semiarcaica, uma coisa preciosa que jamais se conseguiria na Itália. ” Apesar de ser um italiano dirigindo um grupo argentino, as fronteiras do idioma eram para Adolfo grande desafio.
Enquanto aguardava a passagem da temporada de inverno, Adolfo Celi recebeu uma carta vinda de São Paulo. Um certo empresário Franco Zampari o convidava para dirigir um novo teatro da cidade. Como o tal Zampari chegara ao nome de Adolfo Celi? A famosa indicação. Essa realmente não falha! Evi Maltagliati, atriz italiana de renome recomendou Adolfo Celi a Aldo Calvo, que precisava de um diretor artístico para um novo teatro que Zampari e Matarazzo estavam levantando em São Paulo. Foi assim que Celi veio parar na terra da garoa.

Chegando em São Paulo em janeiro de 1949, aos 27 anos, foi direto para o TBC e logo que entrou já subiu no palco para ajudar os atores Cacilda Becker e Mauricio Barroso que aguardavam a sessão da noite começar. Depois de fazer ajustes na iluminação do espetáculo que começaria, Celi sentou-se e assistiu. Não sabia nada do Brasil, nada de português ou sequer um pouco sobre o teatro brasileiro, mas sabia seu ofício e isso bastou.

Para sua montagem de estreia, Adolfo Celi escolhe um texto que já conhecia e havia montado na Itália, The Time of Your Life, de William Saroyan, que aqui no Brasil ganha o nome “Nick bar… Álcool, Brinquedos, Ambições”, com Cacilda Becker (primeira atriz profissional contratada do TBC e um futuro e breve romance para Celi) no elenco, a peça é um sucesso.
Em 1950 a peça a montar é “Entre Quatro Paredes“, de Jean-Paul Sartre. A preparação acaba sendo um tanto diferente para os integrantes do elenco. Em um ensaio o texto é passado sem palavras, em outros o direcionamento do diretor é que cada uma das personagens chegue a sua essência pela imitação de animais que se assemelham, e não apenas pelo entendimento intelectual. Resultado: Nydia Licia tem a volúpia de uma gata angorá; Cacilda tem o ar traiçoeiro de uma cobra e Sérgio Cardoso entende seu covarde Garcin como um rato.

Celia Biar, Adolfo Celi, Tônia Carrero E Luís De Lima – Rio de Janeiro 1979

Ruy Affonso Machado, do elenco de Arsênico e Alfazema, fala sobre o trabalho de Celi nessa encenação: “A linha do papel resultou, evidentemente, do estudo da peça que fiz em companhia de nosso diretor. Mas como você bem sabe o nosso diretor tem um grande respeito pela personalidade de seus artistas: ele prepara o terreno para que o próprio ator faça surgir o tipo desejado, sem interferir despoticamente nessa criação…”
Ainda em 1949, por indicação de Celi, seu amigo e diretor Ruggero Jacobbi, é contratado pelo TBC e todos os espetáculos da temporada desse ano são bem recebidos pelo público do novo teatro.

Caiçara – 1950

Com novos projetos e uma breve pausa nos trabalhos do TBC, em 1950 Celi se envolve intensamente com a companhia cinematográfica Vera Cruz, onde dirige seu primeiro filme: Caiçara, com roteiro de Alberto Cavalcanti, Ruggero Jacobbi e Adolfo Celi.
No ano seguinte volta a direção do aclamado teatro para mais uma glória: “Seis personagens à Procura de um Autor”, de Pirandello. mas sua história com o cinema não acabou. Ainda na Vera Cruz em 1952, Adolfo Celi dirige Tico-Tico no Fubá, uma ousada produção sua e de Fernando de Barros, com Tônia Carrero e Anselmo Duarte. Quem também faz parte dessa produção é o empresário e mecenas das artes da atuação, já conhecido por nós, Franco Zampari.

Entre choros e glórias na direção teatral, Adolfo Celi tem um projeto ambicioso: juntar num mesmo espetáculo as Antígones, de Sófocles e a de Jean Anouilh. Resultado: três Prêmios Saci, um deles para a direção do espetáculo. Por volta de 1954, nosso diretor assina a comédia “Uma Mulher do Outro Mundo“, de Noel Coward que acaba tendo uma produção mais modesta que as habituais do TBC, o que revela os desgastes financeiro que o empreendimento vem passando.

Se o TBC já foi conhecido por ter montagens de respeito, ser um dos melhores teatros do seu tempo e se viveu momentos de glória em sua história, Adolfo Celi ao lado de Franco Zampari e Cacilda Becker são os três maiores responsáveis pelos feitos. Por um bom tempo, desde a inauguração do teatro da rua Major Diogo, Celi foi responsável por definir os rumos artísticos, repertório e estilo das produções, os acabamentos técnicos de qualidade para o toque necessário as montagens e por formar seus atores, exigindo e contribuindo sempre nas criações individuais do elenco.

Foi em 1955 que Adolfo Celi sai finalmente do TBC e muda-se para o Rio de Janeiro fundando a Companhia Tônia-Celi-Autran (CTCA) ao lado do ator e amigo Paulo Autran e sua então esposa Tônia Carrero. Antes do lançamento da Cia, é publicado um documento nomeando o repertório de encenações que será apresentado pelo grupo nos próximos anos. Para a estreia no Teatro Dulcina é escolhida Otelo, de Shakespeare. Uma das melhores montagens de textos do bardo até então no Brasil. Otelo se torna o acontecimento teatral mais importante de 1956 na cena carioca. Como nem tudo são flores, dois anos após o sucesso de estreia, Celi dirige um dos fracassos da CTCA: Frankel, de Antônio Callado. Em 1958 o grupo abre o “Teatro das Segundas-Feiras”, um espaço experimental no CTCA que mostra um repertório de autores de vanguarda como Samuel Beckett.

Tônia Carrero, Adolfo Celi E Paulo Autran

Visando a nacionalização, a Companhia Tônia-Celi-Autran se propões a realizar um concurso de dramaturgia na busca de autores nacionais, encenando uma montagem de Olho Mecânico, de Antonio Carlos de Carvalho, que levou primeiro lugar no edital. No fim do mesmo ano, a CTCA viaja para São Paulo e ganha alguns prêmios com suas montagens no mercado paulista.

Em 1961, os rumos do grupo começam a mudar. Eles realizam mais um concurso e o vencedor do momento é: Lisbela e o Prisioneiro, de Osman Lins. Logo depois, uma remontagem de Arsênico e Alfazema, de Joseph Kesselring, e por último Um Castelo na Suécia, de Françoise Sagan, na qual Celi está também em cena como ator. Nesse momento o diretor já não está tão atuante e focado na Cia, paralelo a esse trabalho, ele é também diretor do Theatro Municipal do Rio de Janeiro. No ano seguinte a Cia começa a se dissolver aos poucos, com algumas desistências internas e dificuldades financeiras.

De volta a Itália em 1961, Adolfo Celi encerra seu relacionamento com Tônia Carrero e também temporariamente, seus trabalhos no país tropical e começa a construir uma próspera carreira como ator de cinema em sua terra natal. Anos depois, a convite de Paulo Autran, volta ao Brasil para dirigir a comédia Pato com Laranja, inaugurando o Teatro Villa-Lobos. Aproveitando a estadia, dirige também outra comédia, Teu Nome é Mulher, para Tônia Carrero, seu último trabalho no Brasil.

Adolfo Celi em 007 Contra a Chantagem Atômica

Voltando a sua terra mãe, retoma seu ofício de ator e diretor de teatro e trabalha também na carreira cinematográfica, faz participação em filmes nacionais e estrangeiros como Este Mundo É dos Loucos, de Phillipe de Broca, 1966; Brancaleone nas Cruzadas, de Mario Monicelli, 1970; O Fantasma da Liberdade, 1974, de Luis Buñuel, e como o gângster Emílio Largo, o vilão em 007 Contra A Chantagem Atômica, de Terence Young, 1965 (que o faz muito conhecido internacionalmente).

Além do romance com Cacilda Becker, o casamento com Tônia Carrero, e outros relacionamentos, Celi casou-se com Verônica Lasar. Com a última, teve um casal de filhos, Alessandra e Leonardo,. Sua filha Alessandra é atriz. 
Em Siena, no ano de 1986 morre Adolfo Celi, aos 64 anos vitima de uma parada cardíaca. Mais uma estrela das artes de apaga da terra para ficar iluminando nossas memórias e nossa história.

Texto por: Gabi Risso

Bibliografia
Encicloédia Itaú: https://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa351557/adolfo-celi
História do Teatro Brasileiro: João Roberto Faria
A Missão Italiana: Alessandra Vannucci

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